DIVÓRCIO. Nada é feito para durar, tampouco é sólido?!

Nesses anos de advocacia nunca fiz tanto divórcio como atualmente. Já cheguei a escrever sobre esse tema mas ainda me assusto com os números. Muitas pessoas pensam que por ser advogada devo estar no piloto automático, ou seja, repito o que a lei diz, o que os tribunais entendem, peço os documentos, falo sobre os honorários e pronto. Ainda não consigo fazer isso, espero que nunca faça algo de forma tão mecânica.

Cada pessoa que senta na minha frente é um ser humano diferente, tem sua história, seus sonhos, seus castelos que, naquele momento, estão sendo desfeitos e, muitas vezes, não sabem como  começar a reconstruir suas vidas. Aquele que decide pelo divórcio também sente muito. Sente por precisar tomar a iniciativa e querer uma vida diferente, e muitas vezes se sente extremamente culpado por desejar algo novo. É muito sentimento envolvido que precisa ser trabalhado.

Penso que OUVIR, apenas, ainda é minha função principal nesses casos. Muitas vezes o cliente chega com grandes mágoas, com grandes dores, e quer o divórcio para ontem, pensando que talvez, se tudo estiver “resolvido” no papel, como em um passe de mágica, se resolverá a vida. Não trabalho assim. Como para o casamento existiu um período de “namoro”, “noivado”, ou seja, planejamento, para o término também precisa do tempo (amadurecer a decisão).

Costumo recomendar a leitura do sociólogo polonês Zygmunt Bauman “Amor Líquido – Sobre a fragilidade dos laços humanos”, um de seus livros mais conhecidos no Brasil. “Vivemos em tempos líquidos, nada é feito para durar e tampouco é sólido. Os relacionamentos escorrem das nossas mãos, por entre os dedos, feito água“. Pela facilidade moderna, nos conectamos e nos “desconectamos” das relações. Mas não estamos tratando de vida virtual, é a vida de pessoas, com sentimentos, com sonhos, com frustrações…

Pergunto: Quando o diálogo desapareceu? Desde quando você foge da vida nas redes sociais? Faça uma analise. A televisão ou o livro se tornou a melhor companhia? O trabalho é sua prioridade e está se tornando um workaholic? Faça uma analise antes de explodir, tente consertar esse relacionamento com essa pessoa que sonhou contigo. Eu acredito em recomeços, em reencontros, em reconciliações.

Bauman também fala no amor próprio. Da necessidade das pessoas se sentirem amadas, amparadas, importantes na vida do outro. Precisam saber que fazem falta. Você faz falta na vida de quem? Não estou falando de comodidade, estou falando de fazer falta mesmo, por quem você é e não pelo que você representa. Já pensou sobre isso? Não quero aqui criar uma crise de consciência, mas talvez seja o momento de dialogar.

Existe uma diferença entre afinidade e parentesco. Esse não te dá escolha, é laço que não se quebra jamais. Agora a afinidade é voluntariamente escolhida, e por isso, se torna muitas vezes descartável.  “Para ser feliz há dois valores essenciais que são absolutamente indispensáveis, um é segurança e o outro é liberdade. Você não consegue ser feliz e ter uma vida digna na ausência de um deles. Segurança sem liberdade é escravidão. Liberdade sem segurança é um completo caos. Você precisa dos dois”, afirma Bauman.

Não estou dizendo aqui que você não deve se divorciar, não é isso. Mas estou dizendo que deve ser uma decisão muito bem pensada, analisada. Como você passará pelas fases do luto, se indagará se realmente fez tudo que deveria. Até a Igreja Católica está relativizando e permitindo novos casamentos de seus fieis. Sei que existem muitos casamentos que simplesmente terminam e nada pode ser feito e você não está condenado a apenas sobreviver.

Mas analise, algo deve te fazer feliz nessa relação. Se nada faz, então, realmente, é o momento de pensar em trilhar novo caminho. Muitas pessoas me dizem que estão casadas por diferentes motivos, por causa disso ou daquilo, eu não julgo. Se você ainda tem um motivo para continuar casado, pois bem, talvez seja o motivo certo. Se te faz feliz, seja feliz. Agora se não te faz, se não tem motivo nenhum, uma hora ou outra vais explodir, não adianta fugir fazendo mil coisas, existe a noite quando o vazio chega e você percebe que só existe isso, o vazio. “Uma vida cheia de nada” (não sei quem disse isso!).

“Cada um sabe a dor e a delicia de ser o que é” (Caetano Veloso  – sempree!). Não julgo nenhum relacionamento até porque não considero nenhum perfeito. O meu durou 12 anos, perfeito ou imperfeito foi o relacionamento que me fez crescer e chegar até aqui. Sei que passamos por fases, que viver com outra pessoa é difícil, exige comprometimento, exige vontade de fazer dar certo.

A jornada da separação é fundamentalmente pessoal. Como é sua motivação. Como diria Fabio Novo, você é o agente e o resultado dessa experiência, é o começo, o meio e o fim. “Ninguém poderá caminhar o seu caminho em seu lugar”, Como seria bom dar uma espiadinha no futuro e ver que tudo se resolveu. Ver que quem deveria partir, partiu e que você está sorrindo novamente.

Sua vida nesse momento pode parecer uma grande aventura SOLITÁRIA, mas “a responsabilidade da caminhada é única e exclusivamente sua – os méritos também“. Portanto, continue a caminhar, apenas. Lembre-se de como era antes do casamento e se refaça.

As pessoas querem saber quanto tempo vai demorar para a dor passar. Se eu tivesse essa resposta talvez não fosse advogada (rs!). O que posso dizer é que não há atalhos. Muitos procuram fugir da dor fazendo festa todas as noites, outros se afundam em trabalho, há aqueles que namoram enlouquecidamente tentando substituir a pessoa que se foi (somente se magoam), e ainda aqueles que não conseguem sair da cama e perdem as forças chorando… portanto, só posso dizer que não tenho a resposta, é uma situação pessoal sua, depende das experiências e do seu grau de evolução.

“A insatisfação – aquele incômodo que não desaparece – deverá ser o primeiro sinal e também o inicio do processo de transformação” (NOVO, Fábio), então, TRANSFORME-SE na melhor versão de você, mesmo com medos, angustias, desânimos e muita confusão, o futuro não poderá ser trilhado por alguém que não seja você mesmo.

O primeiro passo é consertar o eu interior. Tudo bem se ele estiver destruído e precisar ser colado pedacinho por pedacinho, comece logo seu processo de cura. Poucas pessoas que conheço não tiveram um momento de extrema dor. O divórcio é uma das piores dores, tanto que suas fases são as mesmas do luto.

Percebo que muitas vezes o casal esquece que são pessoas diferentes, perdem-se na ilusão de que se tornaram um só. Esquecem de se admirar. Esquecem que estão em constante modificação, que não são os mesmos de 20 anos atrás, e, diante de tanto esquecimento, uma hora o amor vai embora e não volta mais. Se o amor se vai e ainda resta a amizade, um relacionamento legal, saudável, de companheirismo, ainda vale a pena ficar. Não existem aqueles romances tórridos da novela das 8 (agora das 9!), existem duas pessoas que lutam para dar certo. Que se curtem. Podem dizer que não sou romântica, mas o racionalismo ainda me faz melhor.

Não é na primeira, ou na milésima discussão que você deve ir embora, agora, quando não existe mais respeito, quando nada mais existe de bom, quando você coloca na balança e verifica que nada mais restou, então chegou o momento.

Não se torne inimigo da pessoa que viveu durante tantos anos. Se você viveu com essa pessoa, deu certo, mas acabou, saia da relação com dignidade, não importa o motivo do término. Tente entender que a vida está te proporcionando uma nova oportunidade, e que você precisa aprender, ou reaprender a viver com você, sem precisar mais pensar no outro. Quem sabe não era isso que você precisava?

Tenho muitas histórias de vida, poderia escrever um livro sobre os sonhos, os olhares, sobre as dores de cada um que senta nessa cadeira vermelha na minha frente, mas são tão particulares que cada história fica aqui, no meu coração. Tenho a esperança de que essas pessoas superem logo e sigam, vejam que a vida é boa demais e se abram para um novo amanhã. As estações passam, inevitavelmente, você sofrendo ou não, então, se esforce mais um pouquinho para ser feliz.

Por fim, trago um conselho que não é meu, é um conselho popular, que minha vó falava, que você deve ter ouvido tantas vezes “nada como um novo amor para curar o velho!” se é isso não sei, mas estou repetindo o que ouvi e parecia um bom conselho.

Esse novo amor, pode ser o AMOR PRÓPRIO. Esse não vai te decepcionar.

Lembre-se: Você só tem essa vida.

“Devia ter amado mais
Ter chorado mais
Ter visto o sol nascer
Devia ter arriscado mais e até errado mais
Ter feito o que eu queria fazer
Queria ter aceitado as pessoas como elas são
Cada um sabe a alegria e a dor que traz no coração” (Titãs)

P.S. esse texto foi escrito especialmente para uma grande amiga.